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segunda-feira, 28 de maio de 2012

Greve nas federais, uma surpresa?



Por Marcelo Badaró Mattos (Professor de História na UFF)

Os que ingressaram nas Universidades Federais nos últimos sete anos, ou seja, muitos servidores técnico-administrativos, cerca de metade dos docentes e praticamente todos os estudantes, nunca viveram a experiência de uma greve de docentes. Em 2011, quando Fasubra e Sinasefe (as entidades nacionais de servidores técnico-administrativos e trabalhadores das instituições federais de ensino básico e tecnológico), fizeram uma greve, havia uma forte expectativa de greve dos docentes das Universidades Federais, mas a categoria não se mostrou suficientemente mobilizada e a greve não aconteceu. Para muitos isso pareceu significar o fim de uma era, marcada por greves docentes a cada dois anos em média e por fortes enfrentamentos com os governos e seus projetos para a Universidade brasileira. No entanto, nas últimas semanas, propôs-se e deflagrou-se uma das mais fortes greves da história do sindicalismo docente nas federais, com a adesão de 48 instituições em poucos dias, muitas das quais Universidades novas, criadas nos últimos anos. Para quase todos, uma surpresa.

A dinâmica dos conflitos sociais nos reserva surpresas, mas não nos dispensa de compreendê-las. Por que uma greve tão forte emergiu nestes últimos dias?

Para entendê-lo é necessário reconhecer que a pauta do movimento, curta e direta, representa de fato uma forte insatisfação. A pauta: uma reestruturação da carreira docente e a melhoria das condições de trabalho. Sobre a carreira, a questão é simples: após 25 anos de aprovação do Plano Único que passou a reger a carreira docente, em 1987, sucessivas políticas salariais para a Universidade depreciaram e desestruturaram a carreira. O que se reivindica é, basicamente, uma única linha de vencimento nos contracheques (com a incorporação das gratificações e o entendimento do percentual de titulação como parte do vencimento), com 13 níveis, steps (percentuais entre os níveis) de 5%, acesso interno à carreira ao nível de Professor Titular, com paridade entre ativos e aposentados e isonomia entre professores(as) da carreira do magistério superior e da carreira de ensino básico, técnico e tecnológico. O piso para professor 20h no início da carreira seria de R$ 2.329,35 (um salário mínimo do DIEESE, calculado com base nas necessidades mínimas de um trabalhador e sua família, conforme dita a Constituição). O governo, que comprometeu-se a concluir negociações sobre o tema em março e agora fala em adiar a questão para 2013, acena com uma carreira mais desequilibrada em termos salariais, com um piso baixíssimo e promoções atreladas a critérios produtivistas, visando diferenciar um pequeno contingente melhor remunerado (por projetos e pela atuação em pós-graduações) e uma imensa maioria de docentes sobrecarregados com a elevação da carga de trabalho em sala de aulas de graduação. Já quanto às condições de trabalho, cinco anos após o início do REUNI, as instituições federais criaram centenas de novos cursos e ampliaram em dezenas de milhares as suas vagas de ingresso discente. O governo, entretanto, não garantiu até agora nem mesmo o relativamente (à ampliação das matrículas) pequeno número de concursos públicos para docentes com o qual se comprometeu em 2007. As obras de expansão carecem de verbas para sua complementação, gerando ausência de laboratórios, bibliotecas e salas de aula nas novas unidades, assim como superlotação nas antigas. Some-se a isso a enorme deficiência no campo da assistência estudantil, cada vez mais necessária na medida em que entre os novos estudantes tendem a ingressar contingentes cada vez maiores de trabalhadores(as) e filhos(as) de trabalhadores(as), sem condições de arcar com os custos de transporte, moradia, alimentação e material didático minimamente necessários para a vida universitária.

A greve pode ter colhido a muitos(as) de surpresa, mas está longe de ser um fenômeno de difícil explicação. Professores e professoras (e estudantes que aderem ao movimento em muitas universidades) optaram por esse instrumento de luta porque estão conscientes de sua necessidade diante da deterioração de sua carreira e das condições de trabalho. E perceberam que ou freiam agora o desmonte, ou serão arrastados ao fundo do poço em poucos anos.●

Este texto é uma versão menor de uma carta aberta publicada pelo professor Mattos em reposta ao professor Daniel Aarão Reis.

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